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Em busca da essência de San Marino, o minúsculo vizinho da Itália

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The New York Times

Nesse país montanhoso de apenas 62 km², conhecido por abrigar uma das etapas da Fórmula 1, é preciso ir a fundo para ver algo além do verniz turístico

Os picos recortados dos Apeninos? Vertiginosos. O Adriático fugidio? Do azul-celeste ao turquesa. A cozinha farta da Emília-Romana? Deliciosa, como sempre. A descrição pode parecer a de férias ideais na Itália. Porém, se você estiver desfrutando o cenário maravilhoso e um ótimo sangiovese na minúscula República de San Marino, por favor, não comece a falar no quanto adora viajar à Itália.

"Nós somos pequenos, mas somos um Estado – um Estado completamente independente", disse Sabrina Giancecchi, samarinesa que trabalha na agência de turismo do país, quando perguntei a ela sobre o relacionamento de San Marino com o vizinho tão maior, com o qual compartilha o idioma e boa parte da História. "Até os primeiros anos do século passado, era muito difícil chegar aqui, principalmente no inverno, então nós ficávamos muito isolados. Hoje em dia as coisas estão bem diferentes."

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Na verdade, o turismo agora é um grande negócio para San Marino, um país montanhoso de apenas 62 quilômetros quadrados cercado pelas regiões italianas da Emília-Romana e Marche, a poucos quilômetros da costa do Mar Adriático. Embora os cidadãos de San Marino somem perto de 32 mil habitantes, com outros 17 mil vivendo no exterior, o número de visitantes ao país aproxima-se de dois milhões por ano. A capital, a Cidade de San Marino, sofre claramente com o excesso de lojas de suvenires. Porém, por baixo das bugigangas para estrangeiros, os viajantes ainda podem descobrir a beleza real e a personalidade peculiar de um país minúsculo.

Como parte de uma viagem maior à região da Emília-Romana no final do ano passado, eu passei alguns dias buscando a autenticidade em San Marino. Em parte, fui visitar um amigo italiano, Daniele, que se mudou para lá há alguns anos para viver com a namorada samarinesa, Lucia. Porém, antes de encontrá-los, tentei entender o lugar sozinho. Minhas primeiras paradas foram nas três antigas torres de vigia que definem a paisagem de San Marino, e sobem acima do pico mais alto dos Apeninos no país, o Monte Titano. Em uma tarde de tempestade e neve, caminhei pelos antigos baluartes, entrando na primeira torre de vigia, chamada Guaita, e subi várias escadas de madeira raquíticas até chegar ao nível superior. Daquele pequeno cômodo, 19 janelas davam vista a todas as direções, com o azul do Adriático e o litoral de Rimini claramente visíveis a Leste. Logo abaixo eu via várias das nove cidades do país, conhecidas como "castelli" (castelos).

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O que ficou ainda mais óbvio daquela altura era o que havia garantido a independência celebrada de San Marino ao longo dos séculos: a própria gravidade. Isto, e muitas armas; cujos exemplares maravilhosos encontrei na segunda torre, Cesta, e seu Museu de Armas Antigas.

Depois de ficar boquiaberto com a coleção de alabardas, martelos de guerra e estojos cheios com pistolas para duelo e espadas, eu me dirigi ao Museu do Estado para ver exposições da história primitiva do país, incluindo o recentemente restaurado tesouro de Domagnano, impressionante coleção de joias provavelmente usadas por mulheres nobres da corte de Teodorico, o Grande, rei dos ostrogodos, que viveu a pouca distância da costa do Adriático. Em outra parede, um escudo de armas esculpido em pedra tirado dos portões da cidade do século 14 mostrava as três torres de vigia e a antiga divisa: "libertà" (liberdade).

Segundo a tradição, a busca por liberdade religiosa levou originalmente à fundação do país, quando um perseguido talhador de pedras cristão, San Marino, se instalou no Monte Titano em 301, dando à nação a reivindicação de república mais antiga do mundo. Desde então, as coisas foram muito modernizadas – ao contrário do santo fundador, ninguém mais no país por ele fundado dorme em cavernas –, mas o sistema de governo praticamente não foi alterado nos últimos 800 anos. Quando eu conversei com Giancecchi, ela salientou que o país tem dois chefes de Estado – ambos conhecidos como "capitães regentes" – e seu Parlamento é eleito exatamente como durante a Idade Média.

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No dia seguinte, visitei Borgo Maggiore, antiga cidade de mercado, facilmente alcançável pelo teleférico que sobe e desce o Monte Titano. Ao contrário da turística Cidade de San Marino, Borgo Maggiore não tinha nem turistas nem lojas para turistas. Pelo contrário, eu descobri velhos bairros charmosos, deslizei por minúsculas passarelas entre antigas casas de pedra, fotografei exemplares do Fiat 500, com qualidade de museu, estacionados garbosamente na praça do mercado, e disse "buongiorno" a muitas velhinhas – "zdore" no dialeto local – com quem encontrava nas ruelas.

À medida que o meio-dia se aproximava, comecei a ficar com fome. Um carteiro recomendou um restaurante próximo, o Hostaria da Lino, e alguns minutos depois eu estava sentado ao lado de um grupo de operários de construção, o que julguei ser um bom sinal. A firme e macia "strozzapreti" (estranguladores de padre), espécie de massa trançada, era feita no restaurante, chegando com molho de tomate amanteigado com muita rúcula fresca e pedações de queijo Grana Padano. Seguindo o exemplo dado pelos operários, eu acompanhei a pasta com um pratão de bife "tagliata" coberto com cogumelos aromáticos, e abençoei o carteiro de todo o meu coração.

Quando encontrei Daniele e Lucia, San Marino já começara a parecer um lugar delicioso, mas levemente estranho. O que você diz de um país cuja maquete em escala de seu território inteiro inclui casas grandes o suficiente para serem vistas a olho nu, e que mesmo assim cabe em uma mesa pequena, como a vista no Museu de História Natural? O que dizer de um país cujo Grande Prêmio de Fórmula 1 – o GP de San Marino – acontece inteiramente em um país estrangeiro, bem como sua regata anual? Um país cujos selos valem apenas para endereços domésticos? E também tem a questão da locomoção. Para ver algo além da turística Cidade de San Marino dá para pegar ônibus locais que rodam o país, conhecidos como linhas "domésticas". Ou se precisar ir a um dos castelli distantes, também dá para pegar um ônibus "internacional" que segue até Rimini, Itália, a menos de 16 quilômetros dali.

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Contei algumas de minhas observações a Daniele quando o encontrei no dia seguinte, trabalhando na cozinha da minúscula pizzaria e restaurante de Lucia, chamado Cacao, em castello de Domagnano. "San Marino é um lugar estranho", ele respondeu sorrindo. "Nem sei dizer se existe mesmo." Quando se trata das lojas de lembranças e barracas de camiseta na Cidade de San Marino, talvez não. Debaixo dessa camada, no entanto, encontrei muita autenticidade. As velhinhas em Borgo Maggiore eram reais, bem como os panoramas e a velha Fortaleza de pedra sobre o Monte Titano. O strozzapreti da Hostaria da Lino e o filé mignon, grelhado em carvão, que eu provei no restaurante Cesare, na Cidade de San Marino, eram muito mais do que autênticos. O passatelli que Lucia tinha acabado de colocar na minha frente – tiras macias de massa fresca com alcachofra e pedaços macios de peixe do Adriático – estava entre os melhores pratos que comi durante minha viagem inteira.

Todas essas coisas me pareciam muito reais. Daniele traduziu o que eu disse para um freguês na mesa ao lado. Segundo meu amigo, o homem integrava o Parlamento de San Marino e queria saber o que um estrangeiro pensava de sua terra natal. Em outro país, encontrar um parlamentar em uma pizzaria de bairro não seria impossível, só incomum. Já na minúscula República de San Marino, aonde mais ele iria?

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