The New York Times
Agito, rusticidade e história se misturam na ilha, nova integrante da Comunidade Europeia, que se tornou a queridinha do verão no hemisfério NorteHvar, uma ilha no mar Adriático ao largo da Costa Dálmata da Croácia, é uma contradição de muitas formas. Como visitante, você pode acordar e caminhar por morros cheios de espinhos até uma cidade fantasma medieval e, quando o sol se põe, beber coquetéis de chá enquanto dança música techno. É uma ilha onde hotéis luxuosos não param de brotar ao longo da costa, mas o equivalente a US$ 30 ainda descola um quarto na casa de uma vovó local.
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Vista da cidade de Hvar, na ilha croata de mesmo nome
Foto: Filip Horvat/The New York Times
Turistas passeiam em frente à catedral de St. Stephen, no centro de Hvar
Foto: Filip Horvat/The New York Times
Menus em restaurante em Stari Grad, na ilha de Hvar, na Croácia
Foto: Filip Horvat/The New York Times
Torre do monastério de Stari Grad, em Hvar
Foto: Filip Horvat/The New York Times
Turistas se divertem em passeio de barco pelas ilhotas em torno de Hvar
Foto: Filip Horvat/The New York Times
Presunto e tomates no restaurante Stori Komin, na ilha Hvar, ao largo da Costa Cálmata da Croácia
Foto: Filip Horvat/The New York Times
Quando estive lá em agosto, vi um menino de pés descalços, de uns dez anos de idade, correr até um restaurante com dois peixes enormes que havia acabado de fisgar ser saudado com gritos de "opa" ("uau" em croata) de funcionários e fregueses. Vi três garotas britânicas com turbantes de grife, batom escuro e sandálias de gladiador num bar envolto em chamas. Visitei uma colônia isolada de artistas e comi lagosta atrás de uma corda de veludo.
Hvar é um destino de veraneio popular há mais de um século e, mesmo assim, parece permanentemente empoleirada no status de próxima grande atração. Beyoncé, o príncipe Harry e Tom Cruise estão entre os visitantes recentes e, no ano passado, a "Time Out Croatia" publicou uma reportagem de capa intitulada "A ascensão de Hvar". Agora que a Croácia passou a integrar a União Europeia, Hvar está destinada a ganhar ainda mais popularidade.
Parte da atração é ambiental. Hvar tem clima mediterrâneo brando e excelentes praias de cascalho, pedra suave desbotada pelo sol ou areia branca. A ilha é certamente um dos pontos mais incríveis e ensolarados da Europa, com mais de 2.720 horas de luz solar na média anual.
Ponto central das rotas de navegação pelo Adriático, Hvar se tornou uma ilha-fortaleza veneziana no século 16, e sua maior cidade, também chamada Hvar, tem pórticos de pedra calcária branca perolada para provar isso. É onde os iates de luxo se reúnem, chegando com a maré alta e descarregando a carga levemente embriagada e bronzeada, que passeia pela praça principal e desaparece pelos becos calçados de pedra.
Na minha primeira noite na ilha, desci por um desses becos até o Konoba Luvij, taverna e adega de dois andares escondida atrás da catedral ao estilo renascentista de Santo Estevão, na ponta leste da praça principal. A Luviji é de propriedade da família Bracanovic, que fabrica vinhos há gerações, e seu posip (um branco revigorante, nativo da Dalmácia) é considerado um dos melhores do país.
Depois de terminar minha refeição, um prato satisfatório de berinjela assada recheada com polvo fresco, eu parti com meu posip para os degraus de pedra da entrada, onde encontrei um grupo de artistas eslovenos que vem a Hvar todo verão desde a época da Iugoslávia, quando a geração jovem de espírito livre ajudou a dar à ilha a vida cultural que ainda prospera em suas muitas galerias, colônias de artistas e associações musicais.
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No dia seguinte, os eslovenos me pegaram no porto e fomos para a ponta norte da ilha, passando por morros ondulados recobertos de pinheiros cercando olivais, vinhedos e campos de lavanda de um roxo prateado que há muito tempo são a principal fonte croata da erva. No limite de Stari Grad, cidade mais antiga e ao norte da ilha, cruzamos uma antiga planície agrícola reconhecida pela Unesco em 2008. Fundada pelos gregos no século 4 a.C., Stari Grad é um dos povoados mais antigos da Europa e, com suas casas simples de pedra e orla marítima agradavelmente livre de iates, oferece um contraponto tranquilamente gasto pelo tempo em relação ao rebuliço da cidade de Hvar.
Nós paramos no mosteiro dominicano para ver a impressionante Pietà de Tintoretto antes de partir para o castelo de Tvrdalj, residência de verão do século 16 de Petar Hektorovic, nobre local e poeta. A estrutura bem preservada, que inclui um tanque abobadado de peixes marinhos e quintal, ainda traz a marca lírica do proprietário do Renascimento com inscrições latinas como "infelizmente os dias fogem como as ondas e não voltam mais" e, de forma apropriada, logo acima do lavatório, "se te conheces a ti mesmo, por que és tão orgulhoso".
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No dia seguinte, minha amiga norte-americana Rachel chegou à ilha e decidimos conhecer uma das muitas angras isoladas de Hvar, Mekicevica, mais conhecida pelo nome da taverna do que por seu único ocupante: Robinson. Só dá para chegar lá a pé ou pelo mar; pode-se ir com o táxi aquático que faz paradas ao longo da praia ou alugar um barco. Nós optamos pela segunda opção e, embora nenhum de nós tivesse pilotado uma embarcação maior do que uma banheira, mostramos a carteira de motorista norte-americana, entregamos 500 kunas (cerca de US$ 85) a um garoto local que não tinha mais do que 11 anos e o vimos abastecer nossa própria lancha.
Assim que chegamos a Robinson, um esconderijo banhado pelo sol de frente para a enseada, fizemos nosso pedido e, bem ao estilo dálmata, nadamos enquanto a refeição era preparada. Quinze minutos depois, estávamos comendo Crusoe's Pot, a versão da taverna de um clássico de Hvar, a gregada: frutos do mar (geralmente uma mistura de bacalhau, perca-do-mar, camarão, tainha e peixe-escorpião) cozidos no vinho branco temperado com alho e acompanhado de batatas.
Voltamos ao porto bem na hora em que o sol começava a se por. O céu se tornou laranja e magenta, e batidas de techno competiam entre si nos iates desligados e se misturavam em um pulso constante e denso no instante em que Hvar se transformava em sua outra encarnação de bacanal ao entardecer.
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O coração da festa costuma ser a Carpe Diem, boate ao ar livre decadente que deu início à recente febre VIP. Nela, casais cintilantes deleitam-se em sofás baixos de vime bebendo kir royal, enquanto debutantes vulgares de biquíni Missoni dançam no mármore da elevada galeria veneziana ao som de uma mistura barulhenta de pop e house europeu.
Provei várias refeições ótimas em Hvar, mas não queria partir sem visitar Stori Komin, taverna no povoado medieval abandonado de Malo Grablje, cercado por despenhadeiros escarpados a cerca de três quilômetros da cidade de Milna. Assim que fui convencido de que não era possível chegar de bicicleta e extremamente difícil ir caminhando, contratamos um táxi. Qualquer suspeita que eu pudesse ter de que o taxista estivesse nos roubando com a tarifa de US$ 25 foi logo deixada de lado quando pegamos a estrada em meio ao mato grosso em uma escuridão quase completa. Antes que pudéssemos reclamar, ele encostou e nos vimos cercados por ruínas de pedra desmoronando e uma floresta escura. Dava para ouvir o bater de asas de pássaros grandes e algo não muito diferente de uivos. Ao ver uma luz artificial clara perto de um canto, nós a seguimos, subimos um lance de escadas até as fundações ocas de uma casa há muito tempo abandonada, até que ouvimos vozes e, enfim, chegamos ao terraço do Stori Komin.
O proprietário, homem de meia-idade magro e forte chamado Berti Tudor, explicou que não havia cardápio. "Nós comeremos o que ele trouxer. E se quisermos peixe fresco", ele explicou, rindo maliciosamente, "estávamos sem sorte". "Para comer peixe, é preciso me ligar de manhã." Em vez disso, recebemos um prato enorme de cordeiro, bife e batatas, sardinhas em azeite de oliva caseiro e vinagre, além de uma salada perfeita de rúcula, tomate, pepino e pimenta.
Ficamos até tarde bebendo vinho e contando histórias. Berti nos falou que Malo Grablje remonta ao século 15. O vilarejo foi abandonado na década de 1950 quando a praga filoxera devastou os vinhedos e outras culturas da área, levando os moradores, como a família do proprietário, para Milna, em busca de trabalho. Berti voltou há sete anos e abriu o Stori Komin na antiga casa da família. Quando tentamos chamar um taxi, Berti insistiu em nos levar de volta à cidade de Hvar. Atravessamos a mata com seu jipe e ele nos deixou ao lado do mar. O único som era o do vento nas árvores e, praticamente indiscernível, a distante pulsação de uma pista de dança.
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