The New York Times
Com dificuldade para conseguir crédito, americanos ricos penhoram relógios Rolex, joias e carros como Bentley e McLaren em busca de dinheiroSe você entrar no showroom da Suttons & Robertsons, no East Side de Manhattan, terá a impressão de estar em uma loja chique ou em uma casa de leilão: colares cintilando com diamantes, safiras e esmeraldas enchem as vitrines e facas, garfos e colheres de prata esterlina estão dispostos sobre uma mesa de madeira feita para um monarca. Em uma sala particular, nos fundos, existem versões maiores e mais brilhantes das joias mostradas na parte da frente. No alto da parede vê-se um brasão de armas com aparência real trazendo a imagem de dois leões, com a data de fundação da empresa abaixo: 1770. Somente olhando de perto fica claro que entre os leões existem três bolas penduradas em um gancho: o símbolo internacional de um penhorista.
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Com quase 250 anos de experiência no mundo exclusivo do penhor de luxo, a Suttons & Robertsons veio aos Estados Unidos preencher o que acredita ser uma necessidade crescente entre os norte-americanos abastados que gastaram mais do que podiam e precisam de uma infusão rápida – e reservada – de dinheiro em troca de bugigangas estimadas das quais estão dispostos a se afastar, ao menos temporariamente.
"Existe cada vez mais e mais pessoas ricas em ativos e com problemas temporários de liquidez", disse Jeffrey A. Weiss, CEO da Suttons & Robertsons, que abriu sua primeira loja em Nova York em janeiro. "A gente se concentra no público endinheirado, de primeira linha", afirmou Weiss que, aos 70 anos, ainda retém o sotaque suave do Brooklyn de sua juventude. "Elas têm problemas de caixa. Nós temos o capital para emprestar acima de US$ 1 milhão."
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A Suttons & Robertsons não está sozinha no nicho sofisticado do penhor. Sites como Pawngo e Borro cresceram depois da quebra financeira, oferecendo-se a emprestar dinheiro em troca de joias, relógios e praticamente qualquer artigo caro que pudesse ser despachado pela FedEx. Outros sites como Ultrapawn e iPawn surgiram depois com a ideia de fazer empréstimos maiores, garantidos por automóveis chiques, obras de arte e pedras preciosas. Há pouco tempo, a Beverly Loan Co., casa de penhor de Beverly Hills, Califórnia, negócio de propriedade familiar desde 1938, abriu uma segunda unidade chamada New York Loan Co. no distrito dos diamantes em Manhattan.
Weiss ganhou uma fortuna comandando a DFC Global, que opera cadeias de casas de penhor e de empréstimos de curto prazo em dez países. Nos EUA, ela opera sob os nomes Money Mart e Check Cashing Store. Segundo ele, o aperto no crédito representa a hora certa de atuar em Nova York. "Sem dúvida, nos últimos cinco ou seis anos, credores convencionais se tornaram mais relutantes em conceder crédito em todas as frentes. O tempo que leva para essas instituições tomarem uma decisão aumentou enquanto o apetite diminuiu. Mas dá para entrar em nossa unidade nova-iorquina e sair com dinheiro em uma ou duas horas."
Pagando uma taxa – alta –, é claro. Por exemplo, quem toma emprestado alguns milhares de dólares dando um relógio Rolex como garantia – que parece ser um dos itens mais populares para penhorar –, as taxas variam de 12% a mais de 60% por ano nas casas de penhor online, batendo na casa dos três dígitos nas unidades físicas espalhadas pelo país. As taxas elevadas não são altas o bastante para impedir clientes como Mike Walsh, que compra, reforma e vende casas na região de Chicago. Ele contou que ia ao banco fazer empréstimos até 2008 quando o processo de obtenção se tornou oneroso. Depois de perder várias casas, ele levou dois relógios Rolex e os usou como garantia em um empréstimo com a Ultrapawn. Segundo Walsh, o dinheiro chegou no dia seguinte.
De acordo com ele, os primeiros empréstimos tinham taxa de 5% ao mês, já os mais recentes eram de 3% – ou 36% anuais. Para ele, porém, é melhor do que um empréstimo via penhor típico. "Em vez de pagar US$ 1.800 mensais por um empréstimo de US$ 10 mil, eu pago US$ 300 mensais."
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Que as casas de penhor existam para emprestar dinheiro para quem enfrenta dificuldades é um fato necessário ou infeliz da vida, dependendo do ponto de vista de cada um. No entanto, como quem já teve dinheiro para comprar uma Mercedes McLaren de US$ 450 mil termina a usando como garantia para um penhor de US$ 190 mil com juros de 2,5 % a 4%, como se deu com um cliente da Borro? Geralmente, a pessoa que penhora um artigo terá de deixá-lo na casa de penhor e pagar os juros mensais para manter o empréstimo. Para recuperar o objeto, o cliente deve pagar o principal e todo o juro. Quem deixar de quitar um pagamento dos juros pode perder o item.
A nova onda de penhoristas não aposta apenas que as pessoas vão botar no prego carros, aviões ou, no caso de um cliente da Ultrapawn, um equipamento de terraplenagem. Eles também apostam que enquanto o empréstimo tradicional nos bancos continuar restrito para os indivíduos, os clientes vão voltar. George Souri, diretor do Atria Group, empresa de investimentos privados, disse que seu grupo vê as pessoas ricas como pequenas empresas. "Quando uma companhia necessita de liquidez para financiar operações ou crescer, ela pode ir ao mercado de capital e usar ativos comerciais para obter empréstimos. O consumidor sofisticado não tem essa opção. E a maioria dos consumidores desse nicho não entraria nem morta em uma casa de penhores."
Souri contou ter um cliente com casas em Chicago e Marco Island, Flórida, e um Bentley Continental nos dois endereços. O cliente penhorou um dos veículos, cada unidade avaliada em US$ 250 mil, para comprar um barco por confiar que o fluxo de dinheiro de outros investimentos pagaria o empréstimo. Em outros casos, as pessoas simplesmente têm dinheiro demais preso em artigos de luxo e não o suficiente para pagar coisas como mensalidades escolares ou custas de divórcios, exemplos populares de empréstimos nas casas de penhor sofisticadas.
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Uma preocupação entre os clientes é se o que está sendo oferecido ficará em segurança, principalmente no caso de sites de penhor quando os bens são despachados através do país. Todd Hills, fundador da Pawngo, afirma que sua empresa, como outras casas de penhores online, paga para transportar e segurar os artigos e, como está enviando dinheiro para uma conta bancária, acredita ser possível confirmar a identidade da pessoa – para estabelecer a propriedade de forma tão confiável como se estivesse conferindo a carteira de habilitação em uma loja.
O segmento de luxo do setor aposta que com taxas de empréstimo comparativamente baixas e capacidade de acatar mesmo pedidos grandes de empréstimo em um ou dois dias, ele será capaz de se firmar com clientes que voltam a fazer negócios. Paul Aitken, fundador e CEO da Borro, atribuiu transações repetidas ao desejo humano de gastar hoje sem pensar no amanhã. "Empreendedores gostam de fazer coisas de forma impulsiva e, provavelmente, não são os melhores planejadores. Quando eles têm dinheiro no bolso, gostam de comprar artigos de luxo. Quando não têm, gostam de utilizar esses objetos para levantar dinheiro para o próximo empreendimento." E é assim que ele termina aceitando uma Mercedes McLaren como garantia de empréstimo.
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