The New York Times
Anchova, manjericão e bochecha de porco são alguns dos novos sabores criados para mostrar a versatilidade do alimentoGelato de alcachofra, sorbet de tomate e manjericão, raspadinha de cenoura... a lista mais parece parte do cardápio de um restaurante criativo do que as opções de uma sorveteria ‒, mas a verdade é que os bons sorveteiros artesanais de Roma aderiram aos sabores salgados para se diferenciar em uma cidade onde milhares de gelaterias brigam pelos consumidores. Os sabores exóticos andam estimulando os fãs da iguaria como nunca ‒ e mesmo com os problemas econômicos do país, os aluguéis comerciais, em queda livre, permitiram a abertura de novas casas e a expansão das já existentes.
Mais:
A nova face da comida alemã
No último ano, o número de sorveterias artesanais romanas ‒ aquelas que fazem o produto a partir do zero usando ingredientes de alta qualidade ‒ dobrou. A Vice (Via Fabio Massimo, 64; 39-3105-1733; viceitalia.it/vice), que abriu a primeira casa a sudeste do Vaticano em 2009, inaugurou agora em janeiro a quarta e maior de todas. A Gelateria Fatamorgana já está em seis endereços, sendo que em maio passado abriu uma filial perto dos Degraus Espanhóis. A Gelateria del Teatro abriu a segunda perto do rio Tibre em julho (Lungotevere dei Vallati, 25) e aumentou a primeira, próxima à Piazza Navona, para o espaço ao lado (Via dei Coronari, 65/66; 39-06-4547-4880).
O que diferencia essas sorveterias das outras quase 2.500 existentes na cidade é a dedicação e o capricho no uso só de ingredientes naturais quando praticamente todo mundo apela para misturas industrializadas, óleos vegetais, corantes e sabores artificiais, todos permitidos na produção do gelato. Claudio Torcè, dono da cadeia Il Gelato e considerado por muitos o fundador do movimento natural entre as sorveterias da cidade, calcula que apenas trinta fabricantes na capital evitem os aditivos químicos. Muitos de seus aprendizes abriram suas próprias lojas e valorizam os sabores salgados, outra inovação de Torcès.
Mais:
- Até onde vaia aonda da gourmetização?
Andrea Puddinu, um desses alunos, abriu sua casa no bairro Trionfale, ao norte do Vaticano, em 2012. Ele segue os ensinamentos do mestre e a linha natural, além de apostar nos sabores pouco convencionais.
"Ter sabores salgados, além dos tradicionais, é uma forma de atrair outros clientes", afirma Puddinu, dono da Il Gelato Bistrò (Circonvallazione Trionfale, 11/13; 39-06-3972-5949; ilgelatobistro.it). Pelos seus cálculos, 120 gelaterias abriram no último ano em Roma, embora pouquíssimas sigam a linha cem por cento natural. Mesmo assim, os ingredientes puros não são suficientes para conquistar o freguês em um mercado tão competitivo, afirma ele. "Para competir é preciso apelar para coisas diferentes. Quem entra querendo nozes ou pistache e vê anchova e salmão defumado logo de cara assusta, mas não se esquece. E depois volta."
A gelateria de Puddinu oferece cerca de quinze sabores salgados diariamente no verão, um pouco menos no inverno. E organiza happy hours com as iguarias o ano inteiro. "Eu combino com um copo de champanhe ou prosecco. No verão é uma boa alternativa ao aperitivo clássico."
Mais:
- Busca pela autenticidade é tendência na gastronomia
Marco Radicioni, da Otaleg (Viale dei Colli Portuensi, 594; 39-338-651-5450; otaleg.com), que tem um ano e meio de vida, começou recentemente a seguir a tendência, chegando mesmo a criar sabores especiais para combiná-los com cervejas artesanais. Em uma dessas happy hours, em novembro, Radicioni serviu gelato de alcachofra com Moinette blonde da belga Brasserie Dupont, enquanto a Lilith, bitter ale da cervejaria toscana Brùton, fez companhia ao gelato alla gricia, feito com queijo pecorino, bochecha de porco curada e pimenta-do-reino.
Essas combinações de sorvete e bebidas alcoólicas, principalmente os salgados, é a forma que Radicioni tem de atrair clientes no inverno e poder transmitir sua filosofia. "Em Roma a grande maioria vê o gelato como um alimento doce, consumido só no verão. Acho isso um horror. Ele por acaso refresca ou mata a sede? Esses eventos servem para mostrar ao público que o gelato é versátil e merece ser tratado com dignidade."
Será preciso muita dedicação para combater a queda na qualidade da iguaria gelada mais famosa de Roma, mas Radicioni e mais ou menos uma dezena de outros artesãos como ele estão se empenhando ao máximo. "A cultura alimentar média de Roma é praticamente medieval, fechada a inovações ou qualidade, mas há uma subcultura de gente curiosa, que faz perguntas e quer inovações. São esses os clientes que eu quero".
Leia ainda:
- Jantares plurissensoriais viram febre na China
- Consumidores de luxo mais do que triplicam em 20 anos